sabemos sempre que a culpa não é nossa e mesmo assim assistimos na ajuda, na criação da desculpa perfeita para a ausência da verdade, e a ambiguidade da resposta fica-nos sempre na língua, com sabor acre.
sais de olhos cinza para a noite. sabes que não deves mas mesmo assim reages como se o mundo fosse teu. os suspiros da noite passada ficaram na cabeceira e nem assim te recordas. e calei-me quando te vi, caminhavas tranquilamente assustada, tudo normal, tudo banal, nada te interessava, eu não te interessava. gostava que te pudesses ver com os meus olhos, como brilhavas, o riso sôfrego, letárgico, o amarelo dos dedos que se esticavam em alguma direcção.
tentei ser quem eu pensava que querias ter, e nem assim resultou. desfizeste-te em sangue, novamente, derramada nos olhos de quem me olhava naquele dia. as cinzas que caíam dos céus no dia do meu funeral eram as vísceras queimadas do sacrifício que vos deixei.
foi quando atravessei o rio que soube quem eras. um vento que soprava, lesto, a voz do mar que espalhava, a mensagem que ouvia, as tuas palavras: "volta para mim". sabia que o regresso não tem fim, apenas um caminho póstumo.
e claro, cheguei atrasado ao meu próprio funeral. desculpem.
J
cheguei atrasado
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