elegia a J

quarta-feira, 26 de dezembro de 2007 às 14:03

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Mozart - Requiem
nasceste virado para a parede, através do envelhecer, embrulhado numa espécie de manta, produto fértil em dramas, sem respostas, em viagens com destinos improváveis.

desceste à terra na sepultura que tanto desejaste, numa treva cega, guerra escolhida sem qualquer inimigo do outro lado da persiana.

não conseguiste nunca desviar o olhar do resto do tabuleiro, à espera, desesperado por melhor sorte, na próxima, derradeira (sempre!) jogada.

não há descontos para ti, sofres de igual maneira, peso e medida, e continuaste sempre impávido a tudo, agarrado ao leme dessa pobre embarcação, de convés pintado a rubro sangue, esperma e muito vinho, em vãs e ruidosas esperanças, as mudanças de maré que nunca chegaram.

terias-te estrangulado com as mãos apenas para te dar razão, evitar o afogamento solitário, momento de prazer, o êxtase brutal e impiedoso.

não havia razão para a disputa. e hoje morres bem morto, de morte morrida, sem nenhuma bala que termine o teu sofrimento.

morro para ti, todas as mortes do mundo, no piscar de olhos da eterna amante que te leva, invejosa, tua mortalha, debaixo de terra. a dança que sempre te excitou, o clímax do seu abraço, frio, indolor, sem segundas intenções, fiel e inquebrável amor, gesto puro de morrer.

que descanses de todos os teus cansaços, rodeado de todas as chagas que semeaste em todos nós.

morre, mas morre bem.


J

2 Comentários:

E não é que fica mesmo bem? Completamente diferente do "sem música".
Mas tanta escrita em tão poucos dias! Será o tédio de Castelo Branco ou algo mais?

Beijinho

tédio e algo mais. há sempre uma pedra qualquer nestes sapatos gastos.

obrigado amiga, bjo grande.

J

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