Tenho frio, só, o comboio pêndula na linha e leva-me a casa - vejo belas caveiras de osso negro no reflexo da janela, entre os gritos do passageiro e a parede exterior. Mas depois dos anos de anos de espera encontrei um sítio quente.
As carruagens chocalham e os corpos agitam-se, roubo-te um momento de atenção, penso, decido mostrar-te a inquietude em flash, o encanto dos meus amantes passados, e aposto os futuros, sem nada para morrer - porque a morte nunca tem tostões trocados.
Tubos de metal cromado alongam a passagem até à próxima carruagem de onde não podes voltar.
Apeadeiro. Saio e subo as escadas, os degraus amontoam-se nos meus olhos e a vertigem sacode-me violentamente, luz flash luz, os transeuntes olham desgraçados para dentro, lá em cima esperas-me com o teu exército. A mulher que trouxe ao mundo um império num quarto de hotel, e só porque tens esse olhos esqueces-te da cruz que carregas. Mas as lágrimas, essas, aniquilam o vácuo.
O quarto está escuro, a sala fria, o ar cheira a bafio e julgo que as paredes tombaram. Resguardo-me. A vontade era esta, já to disse, e sei que é errada, eu sei, mas que queres?, se não premir o gatilho o quarto continuará escuro e a sala permanecerá fria.
E o letreiro de néon continua a anunciar vagas no inferno. Anda, vamos passar um bom bocado.
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Caio em mim, frio súbito, aperto as pálpebras com força. Sinto os dentes doerem, os maxilares cerrados. Exalo...
Fecho os olhos, ainda posso tentar.
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Suspiro. Chove novamente, e já não sei onde deixei o casaco, sabes? onde?, resolvi despir-me e não preciso dele - algo me diz que não irei voltar. As nuvens saqueiam a cidade. De onde estou o cheiro a enxofre é até suportável, penso. Tudo se move em balanço marcado, lento, soberbo, redundante, tenho náuseas e dentro em pouco acordo, eu sei que sim.
As pedras da calçada têm sangue, movem-se, trocam de padrões, vês?, agora formam tentáculos e sobem pela fachada onde duas silhuetas discutem junto à janela. Pássaros abrigam-se da chuva debaixo dos alpendres e fitam-me o passo nu com os seus oito olhos de aranhas. As suas penas são cruas, de carne e onde deviam ter bicos têm covas com dois pequenos braços.
As náuseas.
Apoio-me no muro e olho em redor.
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J
Sonho II
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