Texto XXX

quinta-feira, 28 de março de 2013 às 14:28

enquanto que os pés galgam caminho
a mente divaga
    — pega nas nuvens e escreve-lhes estórias no dorso
    — Às chaminés das casas dá-lhes nomes
entretém-se, sonha,
desfia as personagens que passam em parágrafos,
desdobra-as em diálogos,
dá-lhes tatuagens em copos de vinho,
e esconde-lhes o passado em brigas de facas
a bordo de navios que partem e regressam a lado algum.



E ela trabalhava num bar, um bar nocturno, mal frequentado, de copos partidos no chão e almas gastas ao balcão. Tatuado no braço direito um dragão porque, dizia, tinha esfaqueado o homem que a havia violado. Era confuso o ruído; ensurdecedor o fumo; as labaredas de discussões estremeciam o tecto. Jogava bilhar a dinheiro, e era boa jogadora. O decote generoso, o metro e sessenta, davam-lhe vantagem sobre os homens. A cara dura, a linguagem vulgar, sobre as mulheres. A única vez que saiu da cidade  foi para visitar os avós, quando era pequena, mas morreram, depois o pai abandonou-a, a mãe meteu-se nos copos e entregava-se a qualquer homem que lhe desse um pouco de atenção, sem ligar aos abusos. Quando conseguiu, fugiu e agora vive no fim do corredor, do bar, depois do balcão, encostada à parede onde estão colocados os tacos, a fumar um cigarro, a beber o seu vinho.

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